Antonio Carlos Bloes
*
As redes sociais se
constituem em hábito presente na vida de todos nós, atraindo cada vez mais e
mais usuários, especialmente entre jovens já nascidos na era da mobilidade
digital. Não se trata de “modismo”, mas de comportamento definitivamente
incorporado na vida de um número cada vez maior de pessoas. Criou-se uma
espécie de dependência dessa forma de interação interpessoal, não presencial e
imediata. Em qualquer lugar e com apenas um clique pode-se entrar em contato com
uma, várias ou centenas de pessoas.
Recente publicação de
“O Globo” (1) dá conta de
pesquisa feita na Universidade de Pittsburgh, com quase dois mil adultos
americanos de idade entre 19 e 32 anos, revelando que quanto mais tempo as
pessoas passam navegando por plataformas como Twitter, Facebook, Istagram,
Linkedln, Whatsapp e outras, maiores são as chances de elas
experimentarem uma sensação de isolamento social.
Esse é um fenômeno
observado desde a década de 1.990, quando estudos começaram a constatar o chamado
“paradoxo da Internet”, ou seja, a contradição entre a
extrema facilidade e de se manter contato virtual com tanta gente, por
intermédio das redes, e a “ausência real de contato humano”. Ou seja: mais tempo “on-line”, menos tempo no mundo real.
É compreensível,
mesmo ao leigo, essa relação direta entre o aumento do uso da Internet e o
isolamento. Algumas pesquisas constataram que essa prática também aumenta a
sensação de angústia, ansiedade, inveja, frustração e estresse, o que torna a
coisa toda um problema de saúde. Contudo, as conclusões desses estudos também
apontam para o fato de que os malefícios advindos do uso das redes dependem da
forma como os usuários se envolvem com essas plataformas. O que se poderia
afirmar, com alguma segurança, é que, se alguém utiliza as redes para estimular
e aumentar contatos reais com outras pessoas, isso será sempre saudável, do
ponto de vista individual e social.
De todo modo, essa
não é uma questão simples. Ao contrário, é complexa demais para ser tratada
neste artigo, mesmo porque o mérito dessa questão não é o objetivo ora
proposto. Também não se cogita, aqui, do uso das mídias nas relações
institucionais, pois, neste ponto, a Ordem e sua estrutura organizacional se
utilizam das ferramentas e tecnologias como qualquer outro empreendimento,
público ou privado.
O que realmente
interessa, neste artigo, é fazer algumas reflexões sobre o uso das redes
sociais pelos maçons, enquanto irmãos, e as suas relações com a vida maçônica
e, destacadamente, confrontar com as tradições da fraternidade e da existência
necessária da Loja Maçônica, como centro de união e lugar de “encontro real”
entre seus obreiros.
Nesse sentido,
deve-se reconhecer, desde logo, o aspecto positivo que as redes sociais
proporcionam à fraternidade maçônica, dada a rápida interação dos irmãos entre
si e com as atividades da sua Loja e fora dela. Isso vale especialmente nas
grandes cidades, onde a mobilidade urbana é fator que sempre dificulta
encontros presenciais, os quais, por isso mesmo – e quase sempre –, acabam por
se restringir às sessões maçônicas, ordinárias ou não, e eventos importantes
organizados pela Loja no plano maçônico, familiar ou social.
Em algumas
plataformas, como é o caso do Whatsapp, essa
facilidade de interação, para além do contato individual, apresenta pelo menos
duas outras vertentes bastante comuns entre os membros de uma mesma oficina: a)
um grupo específico para tratar exclusivamente de assuntos afetos à
administração da Loja e do seu quadro de obreiros; e, b) um ou mais grupos onde
os irmãos postam livremente aquilo que lhes parece oportuno, dentro do espírito
para o qual esse determinado grupo foi criado. Nestes últimos, a boa
camaradagem e mesmo o bom humor são fatores importantes para agregar e manter
presente o espírito daquela fraternidade em particular.
Óbvio que as
observações feitas acima não esgotam as possibilidades de uso de tais redes
pelos irmãos de uma Oficina, pois não raro se expande e pode interessar a
outros tantos membros de outras tantas Lojas, independentemente de suas
respectivas Potências, sejam elas nacionais ou não. Nesse amplo espectro, não
seria de todo equivocado reconhecer que as redes sociais, assim utilizadas por
maçons, poderiam reafirmar, na prática, aquele princípio de “universalidade da
instituição maçônica”, bem como o sentimento de “pertencimento a uma grande
família”, cujos membros, em comum, cultivam os mesmos rituais, valores e
tradições.
Está claro, também,
que as redes sociais propiciam novos espaços e possibilidades na comunidade
maçônica. Além disso, podem, ainda, ser utilizadas para incrementar novas
metodologias na produção de atividades culturais e na elaboração de trabalhos
doutrinários ou filosóficos, tudo dependendo, apenas, da criatividade dos
irmãos que busquem empregá-las de forma inteligente.
Nesse sentido, a Loja
Harmonia e Trabalho, 222 iniciou interessante experiência no campo da produção
maçônico-cultural, criando grupos de whatsapp e de e-mail, para propor e
desenvolver pesquisas sobre temas específicos (História da Maçonaria,
Filosofia, Simbologia, Doutrina, Ritualismo, Práxis maçônica, ou mesmo de
comentários de lições dos diversos graus). Cada grupo conta com seu
respectivo coordenador, mas o planejamento da pesquisa e a divisão de tarefas
são previamente definidos, de forma que cada um contribua com a parte da
pesquisa que lhe cabe e apresente suas conclusões para debate com os seus
pares. A facilidade está em que a apresentação e desenvolvimento dos temas são
apresentados, pela mídia, aos demais participantes do grupo, para análise,
comentários e discussão, até a formatação do texto final. Com isso, as ideias
são ordenadamente desenvolvidas, debatidas e compartilhadas por todos, coisa
que seria bem mais difícil, caso se tivesse de marcar reuniões presenciais com
os integrantes, para apresentação de resultados e o necessário debate antes da
conclusão do trabalho.
Enfim, mediante essas
metodologias, as redes podem ser mais um importante elemento de integração
entre os irmãos, em torno da valorização da cultura maçônica, preparando
ambiente pedagógico para aqueles que vierem a compor futuramente os quadros da
Loja. Desnecessário dizer que isso melhor orientará as ações do mundo profano,
com base no conhecimento mais aprofundado dos princípios da nossa Sublime
Instituição.
Certamente, essa
ideia não é original e deve estar sendo explorada algures. Entre-tanto, o que
importa encarecer é o fato de que essas novas metodologias e ferramentas
virtuais se constituem, também, em mais um estímulo para aprofundar os
conhecimentos da fraternidade, a par dos tantos outros métodos tradicionais e
ritualísticos que fazem parte da própria essência evolutiva do ensinamento
maçônico.
Para encerrar estas
reflexões, cumpre retornar às considerações iniciais acerca da relação,
observada por especialistas, entre o uso das redes sociais e o isolamento
social. De fato, as redes aproximam as pessoas, mas, como isso ocorre de forma
virtual, acaba comprometendo o envolvimento real e afetivo, se mantido apenas
naquele nível superficial.
As redes vieram para
ficar e são úteis e práticas para manter contatos com velhos e novos amigos,
com colegas de trabalho ou com pessoas que sequer conhecemos pessoalmente,
tornando tudo e todos mais próximos de nós como jamais estiveram. “Porém estamos ajudando menos aqueles que são próximos de nós, não
sabemos nomes de vizinhos e pessoas com as quais convivemos, nossa rede de
relação (física) cai vertiginosamente quando ainda temos 20 anos (idade
considerada como auge da juventude). Em suma estamos nos distanciando daqueles que
estão perto para nos aproximarmos daqueles que estão longe.” (2)
Neste contexto,
impossível não cogitar e reafirmar a existência necessária da Loja Maçônica,
enquanto “tempo e lugar” de encontro entre irmãos para aprofundarem, entre si,
o conhecimento recíproco, como seres humanos iniciados na Arte Real.
Definitivamente, não se concebe Maçonaria tradicional sem o “tempo-espaço” da
Loja, onde os maçons se congregam e trabalham ritualisticamente. Por isso as
Obediências reconhecidas internacionalmente como regulares advertem que, embora
haja sites nesse sentido (Fake Masonary) (3), ninguém poderá
ingressar e participar da Maçonaria pela via da internet, pois todo o processo
é pessoal e exige a presença tanto na iniciação, quanto nas reuniões da
Loja. (4)
A essência da
Maçonaria é aproximar os “seres humanos”, condição para construir uma
fraternidade. Por isso, os primeiros artigos das Constituições dos
Fraco-Maçons, de 1.723, prescreveram a tolerância como virtude elementar e
necessária entre pessoas que professam religiões, filosofias e ideias políticas
diversas. A Loja tem sido, desde então, o lugar onde os maçons se encontram e
superam suas diversidades pessoais, porque se reconhecem simplesmente como
seres humanos. Esse é o motivo pelo qual a Maçonaria há de se tornar o CENTRO
DE UNIÃO e meio de conciliar, por uma amizade sincera, pessoas que teriam,
perpetuamente, permanecido separadas. (5) Essa noção de encontro, que a
Loja proporciona aos seus obreiros, é absolutamente fundamental para a
existência da Maçonaria. É preciso estar presente, física e espiritualmente,
nas reuniões maçônicas, porque é o encontro com outro ser humano que propicia a
possibilidade de um aprendizado sobre nós mesmo. Nesse sentido, a melhor e mais
profunda justificação que jamais ouvi sobre a verdadeira essência da Maçonaria
talvez esteja nas palavras de Leo Apostel, quando afirma que:
Os Seres humanos, basicamente
diferentes – i.é, diferentes social e psicologica-mente, ideológica e
emocionalmente – tentam encontrar-se em nível de intimida-de, fora da sociedade
civil, em um grupo fechado. Estas pessoas chamam a si mesmas de Maçons e
utilizam vários rituais e mitos como instrumentos de suas reuniões. (6)
E essas pessoas se
reúnem para uma reeducação, baseada na redução do conhecimento ao puramente
humano, para depois retornar ao convívio social com um sentimento de
compreensão muito mais rico e fecundo. Essa interação é elementar, porque só é
possível relacionar-se com outro quando aprendo a me conhecer e, vice-versa,
aprendo mais sobre mim mesmo ao relacionar-me com o outro. É em presença dos
irmãos, sob seus olhares, movimentos, ações e palavras que recebo suas ideias e
sou influenciado por elas. Mas isso não retira de mim a minha liberdade e a
minha individualidade. Aprimora-me!
A Loja Maçônica foi,
é e sempre será o “espaço” e o “momento” para os maçons se encontrarem, física
e espiritualmente, cultivando suas tradições obreiras, utilizando-se de
práticas rituais, símbolos e mitos, como instrumentos de aperfeiçoamento moral
e social. Em Loja, cria-se o ambiente propício para encontrar respostas que
existem em cada um e em todos nós e, assim, evoluir enquanto seres humanos.
E isto, jamais será
possível por outra via que não seja presencial, real e não virtual. Aqui, a
internet e redes sociais são inócuas e nunca poderão substituir a verdadeira
iniciação e prática maçônicas. Por essa razão, a Maçonaria e nossas Lojas
regulares são, igualmente, um porto seguro na atualidade, porque é da sua
própria essência que haja o encontro pessoal, real e afetivo entre aqueles
iniciados em seus mistérios, em oposição ao isolamento social, a ansiedade e
estresse, que o exagerado uso das redes sociais possam eventualmente causar.
Notas:
1 – Cf. 06/03/2017, cf. em http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/psicologos-alertam-que-uso-de-redes-sociais-pode-alimentar-solidao-21016908#ixzz4aq0pCm27
1 – Cf. 06/03/2017, cf. em http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/psicologos-alertam-que-uso-de-redes-sociais-pode-alimentar-solidao-21016908#ixzz4aq0pCm27
2 – Cf.
interessante artigo em
<https://www.blink102.com.br/redes-sociais-e-o-isolamento-social>
3 – Cf. http://www.masonicinfo.com/fakemasonry.htm
3 – Cf. http://www.masonicinfo.com/fakemasonry.htm
5 – Cf.
Constituições dos Francos Maçons ou Constituições de Anderson de 1723, Ed.
Fraternidade, SP – 1982, pag. 50.
6 – A Maçonaria
– Um ensaio filosófico, Ed. Maç. ”A TROLHA” 1ª. ed., 1989, Londrina/PR, p. 11
* Mestre Maçom da Loja Harmonia e Trabalho, 222 (GLESP) – Iapetininga,
São Paulo (Brasil).
Fonte:
Disponivel:
https://www.maconaria.net/maconaria-e-redes-sociais-uma-reflexao/
Acesso em 16/9/2017.
Nenhum comentário:
Postar um comentário